"Um homem forte por natureza, e persistente, por que aprendeu a lutar desde que herdou de seus pais a necessidade em sobreviver tendo como único aliado o rio. E sabendo que das águas tira seu sustento e transforma seu habitat em praça de lazer, ao mesmo tempo via de acesso a um destino quase sempre incerto. Eis a rotina de muitas famílias na Amazônia".
A população tradicional que mora nas proximidades dos rios e
sobrevive da pesca artesanal, da caça, do roçado e do extrativismo é denominada
de ribeirinha. Por conta dos aspectos geográficos do país, é na Amazônia que
está a maior parte dessa população.
Além das populações nativas, somam-se a
esta categoria descendentes de migrantes do Nordeste do país.
Na segunda metade do século XIX, muitos nordestinos deixaram
sua terra natal e seguiram para a Amazônia atrás dos empregos oferecidos nas
empresas que atuavam no ciclo da extração do látex das árvores conhecidas como
seringueiras. Na década de 1950, com a crise da borracha, como ficou conhecida
a queda do mercado brasileiro do látex, os seringueiros, como eram chamados
aqueles que se dedicavam à extração desse material, ficaram sem alternativa de
trabalho. A ausência de políticas públicas que tratassem da desmobilização
desse contingente de trabalhadores fez com que eles se espalhassem ao longo dos
rios da floresta amazônica, a exemplo dos Rio Negro e Rio Amazonas, onde
construíram suas moradias.
Por residirem em um ambiente onde a força da natureza se faz
presente, os ribeirinhos aprenderam a viver em um meio repleto de limitações e
desafios impostos pelo rio e pela floresta. A relação desse povo com as
mudanças naturais fez com eles que adaptassem o seu cotidiano, seu modo de
morar e de buscar meios para sua subsistência.
Suas moradias são construídas utilizando a madeira como
principal alternativa de construção. A grande maioria das casas são palafitas,
não possui energia elétrica, água encanada e saneamento básico e estão
localizadas próximas às margens dos rios. Construídas alguns metros acima do
nível do rio para evitar que sejam
invadidas pelas águas durante as enchentes, as palafitas ainda possuem a
tecnologia de uso de tábuas para subir o piso nos períodos de cheia.
O rio possui um papel fundamental na vida dos ribeirinhos. É
através dele que são estabelecidas as ligações entre as localidades com a
utilização de jangadas e barcos como o único meio de transporte. O rio é sua
rua. É nele também que os ribeirinhos executam uma das principais atividades
que lhes proporciona fonte de renda e de sobrevivência: a pesca.
Outra fonte de renda advém do extrativismo, a exemplo da
extração da malva, uma planta muito comum na bacia do Rio Amazonas. A malva
possui uma fibra, retirada no momento da sua colheita nas margens do rio, que é
utilizada como matéria prima na indústria de estofados e tecidos. A plantação
de milho e mandioca, a produção de farinha e a coleta da castanha e do açaí
também ocupam lugar de destaque nas atividades agrícolas das comunidades
ribeirinhas.
A relação diferenciada com a natureza faz dos ribeirinhos
grandes detentores de conhecimentos sobre aspectos da fauna e da flora da
floresta; o uso de plantas medicinais; o ritmo e o caminho das águas; os sons
da mata; as épocas da terra. Esse convívio alimenta a cultura e os saberes
transmitidos de pai para filho.
Entretanto, as comunidades ribeirinhas convivem com o
isolamento econômico e social, ficando à margem de uma série de políticas
públicas e mecanismos de controle da qualidade de vida. A situação geográfica
de muitas dessas comunidades é um dos principais fatores limitantes de acesso
aos serviços básicos de saúde e educação.
Júlia Morim/ Consultora Fundaj/Unesco/ Fotos Frank Wallace Rocha
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