segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

POR QUE O BRASIL MASSACRA 1 MILHÃO DE ANIMAIS POR DIA EM SUAS ESTRADAS?

"As cenas fortes de atropelamentos de animais são constantes em diversas Rodovias, também na região oeste do Pará. Seja por toda extensão da Transamazônica, Rodovia Curuá-Una, Br 163 ou mesmo na Santarém- Cuiabá, o enredo trágico de matança instantânea de animais, toma forma em dimensões cada vez maiores"


BR-101, norte do Espírito Santo, setembro de 2015. Um caminhoneiro sente um cheiro forte e localiza uma anta - o maior mamífero terrestre brasileiro - na margem da pista, em estado avançado de decomposição.
Cinco meses antes, no mesmo trecho da rodovia, biólogos encontraram uma fêmea adulta de harpia, a maior ave de rapina das Américas, debilitada por fraturas e hematomas. Por ali, restos de retrovisor de caminhão. No mês anterior, a vítima fora uma onça-parda.
As cenas com espécies ameaçadas de extinção são um retrato de um filme que não sai de cartaz no Brasil: a matança de animais por atropelamentos em estradas.
Pior é que as cenas fortes de atropelamentos de animais, são uma constante em diversas  Rodovias, também na região oeste do Pará. Seja por toda extensão da Transamazônica, Rodovia Curuá-Una, Br 163 ou mesmo na Santarém- Cuiabá, o enredo trágico de matança instantânea de animais, toma forma em dimensões cada vez maiores.Atropelamentos em estradas sejam estaduais ou federais, é de longe, a principal causa de morte de bichos silvestres no país, superando caça ilegal, desmatamento e poluição.
Segundo estatísticas, são 15 animais mortos por segundo, ou 1,3 milhão por dia e até 475 milhões por ano, de acordo com projeção do CBEE (Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas), da Universidade Federal de Lavras (MG).
Quem puxa a lista são os pequenos vertebrados, como sapos, cobras e aves de menor porte - respondem por 90% do massacre, ou 430 milhões de bichos. O restante se divide em animais de médio porte (macacos, gambás), com 40 milhões, e de grande porte (como antas, lobos e onças), com 5 milhões.


A situação, dizem especialistas, é o resultado natural para um país que desconsiderou os bichos ao planejar as rodovias e ainda dá os primeiros passos na adoção de medidas para minimizar os impactos das vias.

Corrida contra o tempo
"Está acontecendo uma desgraça total e não temos tempo nem de estudar o que ocorre", disse à BBC Brasil Áureo Banhos, professor do departamento de biologia da Universidade Federal do Espírito Santo.

Biólogos cobram ação contra principal causa de morte de animais silvestres no País e alertam sobre 'desgraça' em curso.


Banhos coordena um time que monitora os atropelamentos no trecho de 25 km da BR-101 que corta uma das manchas verdes mais intactas do país. É um mosaico de 500 km² (ou um terço da cidade de São Paulo) de unidades de conservação rasgado pela pista única da via.
Um exemplo do alerta do professor: das 70 espécies de morcegos identificadas na região, 47 já foram atropeladas na estrada - e uma delas era desconhecida da ciência até então. Ao todo, 165 espécies de diferentes animais perderam a vida por ali (10 anfíbios, 21 répteis, 63 aves e 71 mamíferos) – são 50 mortes por dia apenas nesse ramo da rodovia, ou 20 mil por ano.
Essa floresta integra as reservas de mata atlântica da Costa do Descobrimento, patrimônio natural da humanidade desde 1999. Por ser um raro fragmento contínuo de mata, é o último refúgio na região para várias espécies ameaçadas, como a anta, a onça-pintada, o tatu-canastra e a harpia.
O fotógrafo Leonardo Merçon, do Instituto Últimos Refúgios, fez um trabalho de registro da Reserva Biológica de Sooretama, a maior peça do mosaico verde da região. Impressionado pelos atropelamentos, acabou se engajando nas ações de conscientização para a gravidade do problema.
"Você nem precisa de dados para ver o impacto real do problema", afirma ele. Um vídeo do instituto que registrou uma onça-parda atropelada na estrada teve mais de 1 milhão de visualizações.
Um possível caminho para os animais cruzarem para o outro lado da via em segurança, são os dutos de drenagem de água sob a pista, mas nem sempre é simples mudar os hábitos dos animais.
Pesquisador da UFES Áureo Banhos em trabalho para adaptar os dutos de água fluvial para passagem de fauna; ao alto, um morcego passa pela manilha: ao menos 47 espécies desse mamífero já foram atropeladas na Rodovia.
A Eco-101, concessionária responsável pelo trecho da BR-101 em questão, diz que o segmento tem dois radares fixos, velocidade máxima de 60 km/h (especialistas defendem 25 km/h) e dez placas educativas. Afirma ainda promover ações de conscientização e que estuda a "ampliação dos dispositivos de segurança para os animais silvestres".
Ausência de normas
A situação da BR-101 no Espírito Santo – que ainda enfrenta a perspectiva de duplicação até 2025 – é uma amostra aguda de um problema nacional. São mais de 15,5 mil km de estradas atravessando áreas de conservação.
Os pontos críticos estão por todo o Brasil. Um levantamento do Instituto de Pesquisas Ecológicas em três trechos de rodovias de Mato Grosso do Sul (1.161 km nas BRs 267, 262 e 163) entre abril de 2013 e março de 2014, por exemplo, localizou 1.124 carcaças de 25 espécies diferentes, como cachorro-do-mato (286 mortes), tamanduá-bandeira (136) e jaguatirica (7).
E não há normas nacionais específicas para a construção de rodovias que cortam reservas naturais. Tudo tramita como um licenciamento ambiental padrão.
No ar há um ano, a iniciativa do CBEE conta com um aplicativo gratuito pelo qual qualquer pessoa pode fotografar e enviar imagens de acidentes com animais. Os registros são enviados para uma base de dados central e são validados por especialistas cadastrados no sistema, tudo online.
Já são cerca de 15 mil usuários cadastrados e mais de 20 mil fotos enviadas. Para entrar no sistema, cada registro precisa ser validado por cinco especialistas, e ter o consenso de três deles sobre qual é a espécie em questão - são 800 "validadores" ativos na rede, cada um especializado numa classe animal.
"Muitas vezes, as pesquisas sobre o tema no Brasil são muito regionalizadas, restritas ao raio da universidade por falta de recursos. Com o sistema poderemos criar um mapa de áreas críticas de atropelamentos no país e usá-lo como política pública de conservação", afirma Alex Bager, do CBEE.
da redação

Nenhum comentário:

Postar um comentário

PROJETO PÉ-DE-PINCHA - TERRA SANTA/PA

  Na magia da rain forest, como é conhecida além das fronteiras, a natureza de Terra Santa se revela no maior programa de preservação de que...

VISITAS PELO MUNDO

Total de visualizações de página