"A águia norte americana quase perde as asas no Tapajós; inexplicavelmente o grande fracasso aconteceu com glória e apogeu do "american way of life", estilo americano.
No
começo do século XX, as linhas de produção de Henry Ford construíam carros a
uma velocidade jamais vista. Todos aqueles carros precisavam de pneus, e na
época a borracha ainda era derivada das seringueiras do Sudeste Asiático. Para
manter a eficiência de sua produção sem depender dos asiáticos, Ford decidiu
ter sua própria produção de borracha para pneus, e para isso construiu uma
cidade tipicamente americana em plena Amazônia, batizada de Fordlândia.
A história de Fordlândia começou
em 1927, quando Henry Ford adquiriu um terreno de quase 15.000 km² às margens
do Rio Tapajós, no Pará. Anos antes, o Departamento de comércio dos EUA havia
feito um estudo de viabilidade de cultivo de seringueiras no Brasil com
resultados positivos.
Da vontade em construir um mega
projeto capitalista até sua quase realização, foram gastos vários milhões de
dólares. A conta como sempre, foi paga ao final da traumática experiência pelo
governo brasileiro. Fordlândia ficou em ruínas, Belterra ficou com as casas que retratam a cultura norte americana na época. E só.
Fato é que depois de muitos anos,
é possível encontrar cenas de um pesadelo capitalista no meio da floresta, em
duas cidades, Fordlândia e depois Belterra, hoje em ruínas, onde Henry Ford
sonhava que um dia vingasse seu sonho de brilhar economicamente. Ruínas urbanas
que parecem ter saído dos subúrbios dos Estados Unidos, com casas
pré-fabricadas, cinemas, hospitais e escolas. E, de certa forma, foi isso que
aconteceu: no final da década de 20, Henry Ford tentou construir no Brasil uma
espécie de Detroit, cidade norte-americana cuja principal foco era a indústria
automobilística.
Para isso, Ford comprou quando
deveria receber, um latifúndio de 1 milhão de hectares ás margens do rio
Tapajós, a cerca de um dia e meio de viagem de barco de Santarém, no Pará. A
“cidade” planejada pelo empresário deveria abrigar milhares de trabalhadores
brasileiros e estrangeiros, além de servir como fonte de látex para a produção
mundial da companhia. Porém, planejada segundo a “visão” do próprio Ford, que
enxergava Fordlândia em altos padrões, quando na verdade era mais atrasada que
uma cidade do faroeste americano. Assim, o “big” projeto acabou falhando.
Sem paciência para ouvir técnicos
ligados ao meio ambiente ou biólogos que pudessem mostrar as verdadeiras
condições de realização de seu projeto de plantar seringueiras e fabricar
borracha para sua famosa indústria de automóvel em Detroit, o projeto da
Fordlândia começou errado. Sem saber que poderia negociar terras diretamente
com o governo brasileiro — e consegui-las gratuitamente.
Vivaldo e espertalhão, o produtor
rural Jorge Dumont Villares, conseguiu junto com o então governador do Pará
Dionísio Bentes uma concessão de uma grande porção de terra para cultivar
seringueiras. Tudo de graça. Mas a ganancia falou mais alto, quando soube que
Henry Ford procurava uma região para construir sua cidade no Brasil, Villares
ofereceu suas terras a ele por um valor equivalente a quase R$ 3 milhões
atualmente. O problema é que o terreno comprado era montanhoso demais, sem
contar que era também inapropriado para o cultivo de seringueira.
Mesmo assim, Fordlândia começou a
ser erguida em meio à floresta e o projeto foi sendo estruturado. Madeira,
telhas e até mesmo as mudas das seringueiras foram trazidas dos EUA de navio.
Pessoas do Brasil todo seguiam para o norte do país na expectativa de um
emprego na cidade de Ford, mas nem todos eram aceitos, visto que o exame médico
era bastante rigoroso. Mesmo assim, muita gente sem experiência foi contratada,
o que causou desqualificação quase completa da mão de obra.
O Eldorado capitalista- A cidade
do industrial no Tapajós possuía vilas para administradores, com campo de
golfe, cinema e piscina para funcionários. Além disso, ali também se encontrava
um dos melhores hospitais da região e, como se não bastasse, o salário era pago
em dia e no “cash”, em dinheiro vivo, o que incentivava aos colonos.
Mas como dizem, dinheiro não é
tudo. Com o passar do tempo, os funcionários começaram a ficar insatisfeitos
com regras que, na época, eram novas para os trabalhadores, como relógios de
ponto, sirenes e regras de comportamento que desmotivavam a permanência no
local.
Protestos contra as “american
food”- Fordlândia foi palco de protestos no mínimo curiosos. Cansados da
alimentação à moda americana, a base de sucrilhos, espinafres, e pickles, os
funcionários acostumados a comer piracuí, tambaqui, feijão, galinha caipira,
charque assado, e muita farinha, se rebelavam e prometiam greve, caso a empresa
continuasse a servir “american food”, ou comidas sem gosto, como denominavam.
Além desses problemas, as
seringueiras, sem acompanhamento técnico, foram afetadas por um fungo que se
espalhou rapidamente. A explicação é que em seu habitar natural, as florestas,
as seringueiras crescem com mais espaçamento entre elas e, portanto, as pragas
não se espalham com facilidade. Mas os americanos plantaram as árvores muito
próximas uma das outras, de maneira semelhante ao plantio de eucalipto.
Como se não bastasse, foi
inventada a borracha sintética, fato que ingrisilhou os planos da empresa, já
que grandes potências começaram a trocar a borracha natural por essa
“artificial”. A Companhia Ford ainda tentou realocar as plantações em Belterra,
onde foi construída uma segunda cidade, mas em 1945, com o surgimento da
borracha sintética — feita com derivados de petróleo — o empreendimento já não
havia mais razão de existir e foi cancelado pelo presidente da companhia, Henry
Ford II.
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