AQUÍFERO ALTER DO CHÃO
Uma enorme dimensão física formada por fauna, flora, rios e
diversos ecossistemas, componentes fundamentais de manutenção do equilíbrio
dinâmico da Terra e de relevância estratégica para toda a humanidade: não é de
hoje que a região amazônica atrai olhares do mundo inteiro. A biodiversidade da
maior floresta tropical do planeta é tida como uma fonte inestimável de
possibilidades econômicas à espera de estudos e descobertas. E é nesse cenário
que se localiza o Aquífero Alter do Chão, uma reserva com cerca de 86,4
quatrilhões de litros de água subterrânea, suficiente para abastecer a
população mundial em cerca de 100 vezes.
É isso mesmo: 86,4 quatrilhões de litros de água potável,
localizados em uma formação geológica sob os Estados do Amazonas, Pará e Amapá.
Esse número impressionante foi obtido com base em pesquisas realizadas pelo
professor André Montenegro Duarte, do Instituto de Tecnologia, da Universidade
Federal do Pará, como resultado da sua tese de Doutorado em Geociências, que
investigou a potencialidade das águas na Amazônia. A tese, orientada pelo
professor Francisco Matos de Abreu, do Instituto de Geociências da UFPA,
indicou números preliminares, os quais ainda necessitam de confirmação.
O Grupo de Pesquisa em Recursos Hídricos, integrado por
André Montenegro, Francisco Matos e ainda pelos pesquisadores Milton Mata
(UFPA), Mário Ribeiro (UFPA) e Itabaraci Nazareno (Universidade Federal do
Ceará/UFC), prossegue as investigações, mas necessita de recursos financeiros
para confirmar as informações iniciais reunidas com base no cruzamento de dados
provenientes da perfuração de poços para a pesquisa petrolífera e poços de
extração de água construídos em Santarém, Manaus e outras localidades.
“Os poços da pesquisa de petróleo perfurados pela Petrobras,
por exemplo, foram fontes importantes de informação, porque, sendo bastante
profundos, fornecem indicações sobre a espessura dos aquíferos. Já com os poços
para abastecimento, chegamos a parâmetros hidrogeológicos fundamentais para se
ter ideia do volume e da produtividade de água do Alter do Chão”, explica o
orientador da pesquisa, professor Francisco Matos. Cerca de 40% do
abastecimento de água de Manaus é originário do aquífero Alter do Chão, como
também é o caso de Santarém e de outras cidades situadas sobre a Bacia
Sedimentar Amazônica.
Protegida da contaminação
O aquífero é um tipo de formação geológica capaz de
armazenar e liberar a água. Há outras unidades que podem armazenar, mas não
permitem que a água que está dentro delas seja utilizada. Para fazer uma
analogia, o aquífero seria como uma esponja, como as que servem para lavar
louças em casa. A esponja fica cheia d'água, mas se ela for movimentada ou
pressionada, a substância é liberada.
O nome Alter do Chão se dá em referência a uma das mais
belas praias do País, situada na região de Santarém. Segundo Francisco Matos, a
existência desse aquífero já é conhecida na literatura da área desde a década
de 50. “Ainda não temos uma avaliação exata sobre a sua real extensão e a
quantidade de água que contém. A novidade da pesquisa de André Montenegro é,
justamente, o valor apontado de 86,4 quatrilhões de litros de água, que é,
realmente, uma coisa fabulosa em termos de reserva”, ressalta o professor
Francisco Matos.
As águas subterrâneas representam a maioria das águas no
mundo. “Se você pensar, por exemplo, no caso da Amazônia, as águas visíveis, ou
seja, as contidas nos rios, lagos, chuvas, representam 16% do total existente,
enquanto 84% correspondem à água subterrânea”, explica o professor. Isso quer
dizer que os aquíferos são grandes depósitos de água de qualidade, pois as
águas subterrâneas são muito mais protegidas do que as águas superficiais, uma
vez que estão menos sujeitas a processos externos de contaminação.
É assim que os aquíferos da Amazônia, na relação que
estabelecem com as outras formas de ocorrência de água, dentro do chamado ciclo
hidrológico, agregam grande valor ambiental, econômico e estratégico. Além do
Alter do Chão, outro aquífero importante na região é o denominado Pirabas,
situado em profundidades entre 100 e 120 metros. Ele oferece água de excelente
qualidade na Região Metropolitana de Belém e é responsável por,
aproximadamente, 20% do abastecimento público.
No Brasil, há outros aquíferos importantes, como é o caso do
Guarani, considerado o maior aquífero nacional e com grande valor estratégico,
pois está em uma região com grande demanda de água, abrangendo os Estados de
Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul, estendendo-se à Argentina, ao Paraguai e ao Uruguai. No
Nordeste, estão os aquíferos Urucuia (BA), Serra Grande(PI) e Cabeças (MA).
Valor estratégico da reserva

Em se tratando dessa escassez, o pesquisador da UFPA André
Montenegro Duarte, com base nas pesquisas realizadas acerca do aquífero Alter
do Chão, propõe um conceito que visa a preservação das águas mundiais
denominado valor do “não uso”. Esse conceito surgiu há, mais ou menos, 60 anos,
mas ainda é muito pouco difundido, tanto no meio econômico como na sociedade em
geral. A definição parte do princípio de que os recursos naturais têm um valor
de uso, direto ou indireto, como é o caso da água e, o de “não uso”, que é o
valor de existência desse bem.
Isso quer dizer que o recurso ganha valor e importância pelo
simples fato de ser mantido na natureza. “Para citar um exemplo, pensemos no
Rio Amazonas, cuja extensão é imensa. Além dos recursos em fauna e flora que
nele podemos encontrar ou mesmo da própria água que contém, o Rio tem um imenso
potencial de transporte. Esses aspectos lhe conferem valor econômico. E
justamente devido à riqueza que oferece, o Rio Amazonas também tem valor só por
existir”, explica André Montenegro. No caso do aquífero Alter do Chão, as
dimensões impressionantes que possui permitem que seja utilizado de forma
sustentável como recurso econômico e, ao mesmo tempo, como reserva estratégica.
Em outras palavras, o conceito do “não uso” gira em torno da
consciência da sociedade de que o recurso natural pode ter uma grande valia por
ser preservado. E complementa o pesquisador: “o mundo, e a Amazônia de um modo
especial, não pode ser visto apenas como um local do qual se retira o que se
precisa ou o que pode gerar lucro, uma vez que é um sistema muito suscetível a
danos. É grandioso, mas muito frágil. Nós temos tanta abundância de recursos
naturais que o 'não uso' deles pode possibilitar uma agregação de valor e uma
lógica econômica que privilegie um desenvolvimento mais justo e igualitário”. A
UFPA tem trabalhado para gerar essa consciência.
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