"O resultado revela a importância da agregação de valor, buscando possibilitar o aproveitamento dos resíduos com alto valor nutricional."
As vísceras de peixe, que são
jogadas no lixo, podem servir como fonte de ferro para fortificar alimentos –
como biscoitos, sopas e pães - e combater a anemia, doença que atinge 40% da
população mundial. Estudo realizado no Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (Inpa/MCTI) demonstrou que uma farinha produzida a partir do fígado do
tambaqui (Colossoma macropomum) possui alta concentração de ferro e
biodisponibilidade, que é a capacidade de absorção pelo organismo.
O ferro é um mineral essencial
para o corpo humano. É utilizado para produzir hemoglobina, componente do
sangue responsável pelo transporte de oxigênio, assim como mioglobina, que além
de transportar, auxilia na reserva de oxigênio nas células musculares. A falta
de ferro faz com que o organismo produza menos células vermelhas caracterizando
o quadro de anemia, apresentando perda de apetite, diminuição da função
imunitária, alteração de pele e mucosas, baixo peso, alterações
gastrointestinais, alteração na função cerebral reduzindo o trabalho físico e
mental.
Com o título “Aproveitamento das
farinhas das brânquias e do fígado de tambaqui (Colossoma macropomum) como
fonte de ferro: mito ou verdade”, o trabalho tem como autores os pesquisadores
do Inpa Francisca das Chagas do Amaral Souza e Jaime Aguiar, vinculados à
Coordenação de Sociedade, Ambiente e Saúde (CSAS). Os resultados da pesquisa
foram publicados em janeiro deste ano na revista African Journal of
Biotechnology.
Segundo Aguiar, mais importante
que fortificar os alimentos com ferro é avaliar a biodisponiblidade do mineral
no organismo. “Elevadas concentrações de ferro não resultam necessariamente em
altas taxas de aproveitamento pelo corpo humano”, enfatiza.
O estudo teve como objetivo
avaliar a biodisponibilidade do ferro em ratos alimentados com dietas à base da
farinha de fígado e farinha de brânquias (guelras) de tambaqui. “Com base nos
resultados apresentados, verificou-se que a concentração de ferro da farinha de
fígado de tambaqui é altamente biodisponível (absorvida) pelo organismo”,
explica Souza, que é doutora em Biotecnologia.
A concentração de ferro na
farinha de fígado está em torno de 86,74mg /100g, que é superior a farinha de
pulmão, com 46,92 mg/100g. Conhecido como bobó ou bofe, o pulmão de boi é mais
consumido no Nordeste. Para a farinha de brânquia, o ferro foi de 25,78mg/100g
e de baixa biodisponibilidade, não recuperando a concentração de hemoglobina
dos ratos anêmicos.
Conforme Aguiar, a farinha de
brânquia caracteriza-se como uma estrutura de alta concentração de lipídeos
(gordura) e proteínas. Ele explica que a hemoglobina (pigmento vermelho no
sangue) obtida nos primeiros dias para os grupos estudados com as farinhas de
brânquias e de fígado não apresentou diferença significativa, mas depois de uma
semana sim. “Com sete dias de experimento, apenas o grupo experimental do
fígado de tambaqui recuperou a concentração de hemoglobina quando comparado aos
demais grupos”, contou.
Os resultados demonstrados no
estudo, principalmente a utilização da farinha de fígado como fonte de ferro,
revelam a importância da agregação de valor, buscando possibilitar o
aproveitamento dos resíduos com alto valor nutricional, visando o controle de carências
nutricionais.
Deficiência Nutricional
Segundo a pesquisadora do Inpa, a
nutricionista Dionisia Nagahama, a anemia ferropriva é uma das deficiências
nutricionais mais representativas, estando presente em diferentes classes
sociais e condições socioeconômicas. No Brasil, é considerada a deficiência
mais prevalente e se destaca pela freqüência e efeitos.
“Em crianças menores de cinco
anos, a falta de ferro pode provocar retardo no desenvolvimento
neuropsicomotor, comprometimento da imunidade, menor capacidade intelectual ou
menor potencial cognitivo que permanece a vida toda, podendo ser, portanto,
irreversível, mesmo com o tratamento”, explica a nutricionista.
Por Luciete Pedrosa (texto e
foto) – Ascom Inpa
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